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Da Produção à Mídia: Humanizar a Moda é a Única Saída Possível

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“Backstage O Backstage é o podcast do Modefica para falar sobre moda a partir de diversos pontos de vista e para muito além do que vemos nas passarelas, nas revistas, no Instagram e nas manchetes. Sempre com convidadxs especiais contando sua trajetória, e junto com nossa editora Marina Colerato, o Backstage debate indústria, carreira, questões de gênero e raça, temas quentes e futuro da moda. Ouça no Spotify ou iTunes.

 

De reconfigurar as relações de trabalho na moda à destruir a relação doentia de felicidade e consumismo, passando pela real função das coisas e pelo questionamento do estilo de vida vendido por blogueiras e revistas, encontramos  na conversa com Vivian Whiteman ecos de ideias marxistas centenárias que nunca estiveram tão atuais. Sentamos com a jornalista e professora para uma conversa que extrapolou nossas ideias de possíveis, e necessárias, transformações da indústria da moda.

 

 

Conhecida por suas falas provocadoras, Vivian Whiteman tem uma trajetória no jornalismo cultural muito bem respeitada. Talvez você já a conheça por seu trabalho mais recente na exinta Elle Brasil, porém seus passos vêm de longe. Um dos mais marcantes talvez foi a série de reportagens na Folha de São Paulo sobre a ausência de pessoas negras nas passaralas da São Paulo Fashion Week. Foram algumas temporadas literalmente contando as modelos e fomentando o debate no jornal.

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O movimento acarretou numa ação do Ministério Público para que o SPFW se comprometesse a ter uma cota de pessoas negras na passarela. À época, pouco se falava da falta de pluralidade e do racismo na indústria da moda. Hoje, passados 12 anos, ela lembra que esse embate deve ser levado por uma outra perspectiva: “Não existe padrão, o que existe é a diversidade. É uma luta mais contra ignorância do que ficar pessoa contra pessoa ‘você pode existir e eu não posso’. Existem outras configurações e todas elas têm seu espaço”.

Além de jornalista, Vivian é também professora. No papo, ela discorreu sobre suas experiência escutando alunos no ambiente de faculdade, no pessimismo da falta de emprego, no suposto glamour-que-não-se-deteriora da vida das pessoas que trabalham com moda e no misticismo por trás dos influenciadores digitais. “Há pessoas na faculdade que se espelham em ser como blogueiras ricas. Como se tivesse uma fórmula para dinheiro e sucesso”. Vivian reflete sobre a disposição que estas pessoas têm de vender sua imagem e vida pessoal para beneficiar marcas e liga os pontos: a indústria da moda está sempre na próxima estação. “É um mecanismo que a moda sempre utilizou: você coloca um ideal, mas ele foi feito para não ser alcançável. Quando começam a alcançá-lo, a gente muda o ideal. As pessoas falam ‘nossa, você não sabia? Que antigo você! (Isso) já passou!’”, completa.

Vivian agora tem dedicado esforços ao estudo da psicanálise. Ela não consegue olhar para a moda sem analisar os impactos dessa indústria em nossa saúde mental, inclusive de quem trabalha com moda. A indústria da moda é um sistema que funciona de cima a baixo de forma desumanizada. “Qual seria o malefício de humanizar as forças de trabalho?”, questiona ela. Para uma parte significativa da pirâmede dos trabalhadores de moda, o trabalho vem em detrimento da saúde física e mental. Das costureiras em condições de trabalho análogo à escravidão a meninas interioranas de 15 anos que se amontoam em apartamentos e estão sujeitas a toda sorte de abusos e violências.

O futuro da moda é nebuloso. Na atual conjuntora social e política, pensar em futuro é, em si, nebuloso. Mas existem muitas possibilidades, muitas janelas para escapar de como as coisas funcionam hoje. Com a moda, desfiles e modelos de produção em crise, a hora de quebrar os paradigmas da moda é agora. Vivian cita a transparência como movimento em destaque que está surgindo para lançar luz à realidade dessa indústria e a importância de valorizar todo mundo que trabalha nesse indústria. “Só podemos pensar no futuro se as relações de trabalho forem repensadas – e a moda é um dos grandes empregadores do mundo”, instiga ela. Para a jornalista, não há meios de mudar nada se não mudarmos o que é necessário para uma construção de uma relação de trabalho decente.

Outra rota necessária é desconstruir o vínculo entre consumo e felicidade. “É necessário repensar a dinâmica do ‘comprei e estou feliz’, que é instantânea e rasa, e estimular o lado afetivo com as roupas, que sejam um complemento do que você deseja mostrar e ser”. Vivian prossegue com a reflexão que vai além deste episódio: dá para usar a moda como instrumento para se olhar com carinho, para reviver emoções divertidas e para humanizar o mundo.

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